Naturismo e Espiritualidade 3
O terceiro artigo da rubrica Naturismo e Espiritualidade aborda os Três Ismos: Naturismo. Holismo e Vida Alternativa.
TRÊS ISMOS: NATURISMO, HOLISMO E VIDA ALTERNATIVA
1. Nos dois artigos anteriores tentei relacionar o Naturismo com a Espiritualidade e com a Filosofia Cínica grega. Neste, gostaria de trabalhar brevemente o Naturismo em relação com o paradigma holístico.
Quando estudei o Holismo na minha tese de doutoramento em Filosofia (2005) vi que o paradigma holístico se podia resumir em dez teses (poderia haver mais, claro, mas estas dez eram decisivas).
Quais eram então estas “teses”? Seriam as seguintes, expressas em forma de “decálogo” (10):
(1) A Realidade é um Todo fluído, dinâmico, em permanente “actividade” (“princípio heraclítico”). E, contudo, há também “repouso” e “quietude” noutro âmbito da Realidade (“princípio parmenídeo”).
(2) A Realidade é uma totalidade unitária. O Todo é Uno. As “partes” são sempre partes de um Todo. O Todo é mais do que a soma das partes. “O Todo está nas partes”.
(3) Tudo está relacionado com tudo, em interconectividade ou interrelação absoluta (‘paradigma ecológico’: Hipótese de Gaia – Lovelock). Nada se dá à margem da dita interrelação total.
(4) O Macro dá-se no micro (‘paradigma hologramático” ou holográfico’). A única diferença é a dimensionalidade. O Macro-micro, uma única coisa. “Como acima, assim abaixo” (“princípio hermético”).
(5) O Todo está estruturado: ao ser unitário, integra as diferenças, que não são eliminadas, mas sim subsumidas. É um Todo “diferenciado” (a Multiplicidade e a Diversidade estão integradas no Todo). A Realidade é uma totalidade multidiversa.
(6) As identidades particulares ou individualidades não são substantivas, mas provisórias, flexíveis, intercambiáveis (‘paradigma físico da ‘dança de Shiva’: F. Capra). São identidades cambiantes e mutantes. No mundo fenoménico “nada é, tudo muda” (“princípio heraclíteo”).
(7) Não há dualidade sujeito-objeto: o/a observador/a é o/a observado/a. E vice-versa (‘paradigma quântico’). É o fim do dualismo epistemo-ontológico. “A Realidade auto-observa-se”.
(8) O Todo, de um modo epistemo-ontológico, permite ser abordado de modo fenoménico-nouménico. ‘Fenoménicamente’, é diferença, multiplicidade, espacialidade, temporalidade; ‘nouménicamente’ é ‘uno’. A visão holística consiste em “ver” ambos os aspetos interligados, conjugados (“princípio aristotélico”, mas interpretado holísticamente). O nouménico no fenoménico, simultaneamente. E vice-versa.
(9) Utilizando o esquema kantiano, mas noutro contexto epistémico-ontológico, podemos dizer que a mente humana (“Entendimento”, em Kant) só pode captar (discursivamente) os fenómenos. Para captar o Todo com as suas diferenças, o ‘noúmeno’ com os seus ‘fenómenos’, compreensivamente, necessita de um ato intuitivo, transcendental (uma espécie de ‘Razão intuitiva’, utilizando paradoxalmente a terminologia de Kant, mas com outro sentido).
(10) Este ato intuitivo ou intuição originária da Realidade está mais além (ou mais aquém) do pensamento discursivo. É uma experiência pura, originária. É paradoxal, impensável (em categorias lógicas, que funcionam segundo oposições), incomunicável, inexprimível em si mesma. É captável de um modo simultâneo, espontâneo, ruptural, de uma vez por todas (há diversidade de escolas: umas mais ‘rupturais’ e outras mais ‘gradualistas’). Em todo o caso, a experiência holística é uma visão sinóptica da Realidade. É apofática, mas vivenciável (uma “vivência absoluta”), em princípio por e para todo o ser humano.
2. E, se quiséssemos resumir e ordenar estas teses, poderíamos dizer:
(1) A Realidade é um todo ‘fluído’ e ‘em repouso’ (paradigma “heraclíteo-parmenídeo”).
(2) A Realidade é uma totalidade unitária (paradigma da unidade).
(5) A Realidade é uma totalidade multidiversa (paradigma da diversidade).
(3) O Todo é interrelacional (paradigma ecológico).
(6) As identidades são flexíveis e provisórias (paradigma da ‘dança de Shiva’).
(7) Não há dualidade sujeito-objeto de uma maneira absoluta (paradigma quântico).
(4) O Macro dá-se no micro (paradigma holográfico ou hologramático e paradigma hermético).
(8) O Todo é fenomenicamente múltiplo e noumenicamente unitário. A Vivência Holística consiste em “ver” o nouménico no fenoménico (paradigma “aristotélico”). E vice-versa.
(9) A Vivência Holística é intuitiva transcendentalmente (paradigma intuicionista).
(10) A Vivência Holística é sinóptica (simultânea) e apofática (paradigma negativo-paradoxal).
3. Que tem tudo isto a ver com o Naturismo? A resposta poderia ser: o Naturismo é parte desta abrangência holística. Não está fora dela. É um elemento mais de toda uma realidade que é holística. Como seria possível deixar o Naturismo de fora da Realidade? Ficaria um Todo empobrecido. E, como enriquece o Naturismo ao restante Holismo? Em dar-lhe radicalidade concreta de vida pessoal e coletiva. Em tornar-nos mais despojados, des-apegados, livres. Em fazer-nos mais en-carnados na realidade das coisas e do essencial, deixando o acidental. Em tornar-nos mais Todo com o resto da Natureza, sentindo-nos unos com ela. Experimentar mais diretamente o Sol, o vento, a água, a terra…
É possibilitar estar mais impregnados de todos os elementos naturais. O Cântico do Irmão Sol do São Francisco de Assis faz-nos viver em gratidão e harmonia com todos os seres. E, aliás, também os seres inorgânicos são nossos Irmãos e Irmãs.
Além disso, se não é só Nudismo, mas Naturismo, este nudismo social une-nos mais aos outr@s, sentindo-nos corpos sociais.
Porém, não há que idealizar. Os nossos hábitos individualistas, consumistas, competitivos, egocêntricos, em suma, ainda estão muito arraigados em nós, pelo que é preciso muita humildade para ir caminhando nesta linha.
4. Por isso, falamos também da Vida Alternativa. Esta expressão, em alemão (Alternatives Leben) tornou-se um lema importante nos anos oitenta do século passado, como sinónimo de procura de uma vida mais essencial, mais simples, diferenciadora do esquema dominante do mainstream capitalista e materialista. Isto implicava -e implica- uma visão mais radical (=de raiz) do nosso quotidiano, nas suas relações consigo mesmo, com os outros, com o resto da Natureza, com o Transcendente (para quem seja religioso).
Tudo isto acaba por ser subversivo e contestatário à Ordem Dominante.
Procura também outros modelos de inter-relação económica não fundamentadas no lucro individual, mas no coletivo. Um bem-estar existencial e espiritual. Seria outra maneira de nos organizarmos social e politicamente, salientando esquemas autogestionários e consensuais de organização, não verticalistas e hierárquicos, dialogantes, assim como uma cultura da diversidade unificada ou na união diversificada, no respeito, tolerância e procura pessoal e comunitária da verdade das coisas, partilhada…
É preciso ser criticamente conscientes de uma maneira de organizar a vida social já obsoleta e de praticar a maior das desobediências civis que é a de viver de maneira alternativa a todos os níveis da existência pessoal, comunitária e coletiva. Ora, o naturismo também entra, obviamente, aqui. É um elemento mais que nos pode ajudar a tomar consciência de que ser/viver têxtil pode ser só uma opção temporal, em determinados momentos da vida social, mas não a verdade última de nos relacionarmos permanentemente em igualdade, simplicidade e beleza de vida. O Naturismo teria assim valor não só real como simbólico.
Sei que se poderia concretizar muito mais todos estes elementos, mas não pretendia fazer um artigo extenso. Só abrir um debate sobre estas questões…, se houver gente a quem lhe interesse.
Que tal se em futuros encontros naturistas podéssemos debater juntos estas ideias e concretizarmos no quotidiano as suas implicações cognitivas, éticas, económicas, sociais, políticas e culturais?
Seria uma autêntica Weltanschauung (intuição ou conceção do mundo, mundivisão), mas vivida no concreto, no quotidiano e na partilha de vida!
Rui Grácio
28.12.23.
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